segunda-feira, 17 de outubro de 2011

HalcyonAir sem asas para voar

Dívidas avultadas, salários três meses atrasados, profissionais em debandada e nenhum avião disponível. O cenário é caótico na Halcyonair, mas o dono, Jorge Spencer Lima, garante que até finais deste mês a empresa "passarinha" voltará a cruzar os céus de Cabo Verde.


Está em percurso descendente a companhia aérea privada fundada por Jorge Spencer Lima e que começou a operar em 2008. Depois de vários processos pendentes de dívidas acumuladas e voos vazios, eis que surge mais um contratempo que pode prejudicar enormemente a Halcyonair. O ATR 42-500, de 44 lugares, o único que vinha operando nos últimos 12 meses, foi mandado parar pela Agência de Aviação Civil a pedido da Phoenix Aircraft, empresa sedeada em Singapura, que reclama a devolução da aeronave por falta de pagamento do aluguer (60 mil euros por mês).
Há alguns meses, a Phoenix já havia comunicado à autoridade aeronáutica cabo-verdiana o incumprimento dos compromissos por parte da Halcyonair, tendo desde então ameaçado vir buscar o avião. Esgotada a paciência, a proprietária do ATR "Assomada" (nome como foi baptizado pela Halcyonair) solicitou à AAC a cessação da licença de navegabilidade do aparelho para o vir buscar.
FIM DE CONTRATO?
Cumprindo os dispositivos legais no que tange à aviação civil internacional, a Aeronáutica mandou a Halcyonair, na semana passada, parar os voos comerciais do "Assomada", retirando do sistema nacional de voo as viagens da companhia liderada por Jorge Spencer Lima. Um procedimento, recorde-se, igual ao sucedido com a extinta "InterIsland Airlines" que teve de encerrar as portas por falta de pagamento do aluguer dos aviões há uns anos atrás. Neste momento, o "Assomada" está poisado no Aeroporto do Sal à espera que o dono o venha levar de volta à Singapura.
A NAÇÃO tentou um contacto com o presidente do Conselho de Administração da Halcyonair, Jorge Spencer Lima mas até ao fecho desta edição não nos foi possível. Entretanto, Spencer Lima falou a outros órgãos de comunicação social, dizendo que a suspensão dos voos se deveu ao término do contrato com a proprietária do ATR, mas que está a renegociar a fim de manter o "Assomada" no arquipélago.
Scapa, como é mais conhecido, disse ainda não haver motivos para alarme, porquanto no final deste mês chegará o ATR 42-320, de 46 lugares, que estava em reparação nas Canárias.
INCUMPRIMENTOS
Sucede que, segundo as fontes do A NAÇÃO, a Halcyonair também não cumpriu com a oficina de manutenção de aeronaves nas Canárias. É que o ATR 42-320, baptizado de Santa Maria, está naquele arquipélago desde Outubro do ano passado porque a Halcyonair, simplesmente, não pagou os custos de reparação.
Segundo fontes deste jornal, a companhia aérea privada cabo-verdiana foi cobrada 60 mil contos para a reparação total do aparelho, devendo avançar com 50% (30 mil contos) antes do início dos trabalhos, o que nunca terá sucedido. Acresce-se a isso, a taxa de estacionamento que o avião terá de pagar durante todo o tempo que esteve parado no aeroporto de Canárias.
Mesmo com a chegada do "Santa Maria", a Halcyonair poderá sentir grandes dificuldades para retomar os voos normais aqui no arquipélago, sua zona de acção. É que, apesar de o seu dono não o admitir, ela está a passar por sérias dificuldades financeiras. Tanto que não paga o aluguer da viatura (Hyace) que faz o transporte da tripulação de casa para o Aeroporto da Praia há dez meses, o que obrigou o dono do veículo a suspender o contrato na última sexta-feira, e a ir buscar a viatura.
NO VERMELHO
Mais: a TACV tem a autorização do Tribunal para penhorar os bens da Halcyonair de forma a cobrir os 30 mil contos que a empresa de Spencer Lima acumulou junto da companhia aérea de bandeira nacional pelos serviços prestados desde 2008. A penhora não aconteceu, como aliás o relatado por este jornal (ver edição nº 198, de 16 de Junho de 2011), porque os bens em nome da Halcyonair não chegam para cobrir a dívida (o ATR "Santa Maria", por exemplo, está no nome do BAI, banco angolano que financiou a sua aquisição).
Além disso, contam-se milhares de contos de dívidas junto da ASA, INPS e Finanças, que ascendem a cem mil contos. A Enacol, que abastece a Halcyonair, também reclama uma dívida superior a 15 mil contos, tendo inclusive ameaçado suspender o fornecimento.
E, como se não bastasse, neste momento os trabalhadores estão com três meses de salário em atraso, repetindo a série de meses que não viram o seu vencimento no início deste ano. Por causa disso e do cenário nebuloso que se adivinha, muitos deles estão a abandonar a empresa, em quase debandada. Nos últimos dias saíram de uma assentada três comandantes, que preferiram aventurar-se em Angola, Guiné Equatorial e TACV.
SAÍDAS
Também o pessoal da manutenção e de serviços administrativos têm optado por abandonar a companhia – dois técnicos de manutenção foram trabalhar no Madagáscar. Nilton Lobo, que vinha desempenhando o cargo de director financeiro da Halcyonair, deixou a empresa há quase um mês, regressando à TACV.
O clima na Halcyonair está de tal forma tenso que, na sexta-feira passada, 7, um grupo de comandantes e pilotos chegou, praticamente, a invadir o gabinete da directora comercial e "handling", Euriza Carrilho (faz a vez de directora-geral, já que Spencer Lima dedica mais tempo às outras empresas), acusando-a de ser a responsável pela situação dramática por que passa a companhia.
Com este cenário todo, há quem já preveja o fim da Halcyonair nos próximos tempos, ideia, aliás, que ganha força agora com a retirada do sistema de todos os voos da companhia e a constante saída de profissionais.

(In A nação)

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